sexta-feira, 21 de maio de 2010

Alguns comentários sobre a viagem ao Irã

Faz algum tempo que quero escrever algo sobre o acordo que o Brasil articulou com o Irã e a Turquia – aliás, faz tempo quero escrever qualquer coisa útil nesse blog. Mas, a questão é bem delicada e eu estou trabalhando ela em minha cabeça aos poucos. De certo, esse jogo da política internacional é complicado, as cartas que não são jogadas são tão importantes quanto a utilizadas, e nós só temos algum acesso a estas.

Eu sempre gostei muito da posição de Lula fora do país, apesar das diversas críticas feitas ao Presidente e ao serviço diplomático, no sentido de que ele se aproxima demais de figuras como Fidel e Ahmadinejad. Lá fora ele parece representar um país bem melhor do que o ele deixa em casa. Além disso, nunca achei que as visitas a Cuba e ao Irã fossem um desgaste, mas sim um privilégio de quem tinha tamanha admiração e podia conversar até com os fora-da-lei. Na minha perspectiva, Lula estava utilizando bem esta abertura, propondo novas alternativas para lidar com problemas já antigos.

Não nego que os governos do Irã e de Cuba tenham problemas graves, especialmente no que diz respeito à relação com seus opositores. Só que as formas com que se vem tratando estas questões – embargos econômicos, repressões políticas, invasões, etc. – já se mostraram ineficazes e extremamente danosas à população que se buscava ajudar. Esse foi justamente o gancho que deu a presidência à Barack Obama, um homem negro, de origem africana e algo muçulmana. Não é à toa que um dos seus primeiros gestos após eleito foi visitar alguns países muçulmanos e pregar uma reconciliação. Só que Obama parece não ser capaz de abrir totalmente das antigas práticas, nem de apresentar e sustentar métodos novos – vide o aumento de tropas no Afeganistão, a permanência de Guantánamo e o fracasso de Copenhague.

Por isso, quando li que Lula tinha conseguido concertar um acordo sobre o problema do Urânio no Irã, senti uma enorme felicidade e orgulho de ver que o Brasil estava assumindo uma posição independente e marcante no cenário internacional, aproveitando justamente esta demanda por novas perspectivas. Fazia tempo que não via tantas e tão positivas menções ao País nos jornais estrangeiros, sem nenhuma referência ao futebol, ao carnaval, ou à violência. Se tivesse seguido meu primeiro desejo de escrever aqui no blog, teria feito uma exultação deste momento.

Só que essa empolgação começa a ceder lugar diante da possibilidade de o Irã estar usando a ousadia do Brasil simplesmente para enfraquecer a posição estadunidense ou para ganhar tempo para preparar sua próxima jogada. Imagino que esta hipótese tenha ocorrido à Chancelaria brasileira e que eles decidiram assumir o risco. Isto, porém, não é motivo para se tranqüilizar, longe disso.

O que mais me inquieta é ver a forte resistência ao acordo firmado em Teerã, que começou com a crítica aberta de Hilary Clinton, acompanhada de diversos países. Até a Agência Internacional de Energia Atômica se irresignou, parecendo até ofendia por não ter participado do pacto. Mesmo os países que elogiaram a iniciativa brasileira, como a Rússia, estão apoiando a nova rodada de sanções contra o Irã, que conta com o aval de doze dos quinzes países que compõem o Conselho de Segurança da ONU. Segundo Lula, estes países não sabem fazer política sem ter inimigos. Ele deve estar certo, mas neste momento a afirmação pareceu uma verdade desesperada.

No início, entendi a posição dos Estados Unidos como necessária para manter a construção que eles vinham fazendo. Ela poderia servir inclusive para incentivar o Irã a cumprir o acordo firmado. Mas, começo perceber que, do ponto de vista estadunidense, os embargos e as outras tantas sanções nunca foram ineficientes. Estas só não serviam aos que queriam paz e outras quimeras do gênero, mas eras extremamente eficazes em mostrar o preço do desalinhamento. Talvez, tão grande quanto o avanço que a iniciativa do Brasil representou seja a reação encabeçada pelos Estados Unidos, para que se veja por aqui também o peso da independência.

Só espero que esta viagem ao Irã não se mostre uma tentativa inocente de mudar o mudo. Espero não sentir vergonha de um mico em meio à macacos velhos.

3 comentários:

D'Artagnan disse...

Eu, sempre que pude, defendi a politica externa do governo Lula como elemento de grande relevania para o sucesso do(s) mantado(s) desse presidente.

Não dispenso a teoria de que o irã deve manter a vontade de levar a construção de armas de destruição em massa a cabo, mas acredito que essa é mais um argumento daqueles recheados de medo. E um medo fundado.

As práticas estadunidenses na tentativa de consolidar uma hegemonia mundial conduziu alguns países que são oprimidos militar e politicamente a agir violentamente contra o regime opressor e sem essa tensão sem o risco de um ataque nuclear não veriamos novamente céus muçulmanos misseis de precisão cirurgica que matam qualquer coisa?

Não sei o que vai resultar essa coisa toda mas tenho certeza de que não terei jamais vergonha da atitude de um presidente que prega e age dentro da mais pura democracia.

Athos disse...

Pura, pura mesmo, nossa democracia não é. Mas, também me sinto dentro de uma democracia melhor, ou pelo menos com maior legitimidade para propor soluções e intervir na política internacional. Eu até esqueço de como a gente trata mal nosso povo...Acho q eh o efeito Lula.

Só que sinto que o problema é um pouco maior do que ser uma boa democracia brigando por causas melhores. Não adianta só ter boas intençoes, é preciso ter boas estratégias também. Se não, a gente só ajuda a fortalecer as hegemonias existentes e diminuir as esperanças...

D'Artagnan disse...

essa discussão merece um "tete-a-tete"